Eu sou o ser mais preguiçoso da galáxia. Sério. Só estou esperando protocolarem e enviarem meu certificado da associação intergalática.
E andava meio incomodado com o uso do termo nos debates públicos. "Ai que preguiça", cada vez que alguém se depara com uma idéia (I-
DÉ-I-A: tirem as mãos do meu acento agudo) muito, muito contrária. Como profissional do ramo fiquei algo agastado com a banalização do termo.
Mas enfim, estou dando aulas em um colégio e estava tomando o clássico café na sala dos professores. E um professor mais que ateu, ateísta, quero dizer, ativista do ateísmo, me saiu com esta:
"Uma aluna disse em aula - mas se deus não existe como é que os gatos têm listras tão bonitas? - eu simplesmente não tive paciência de argumentar. Que preguiça desse tipo de abordagem." Nota: a aluna tem menos de quinze anos.
Tive que sair do meu habitual silêncio:
"É por causa de uns profissionais fraquinhos como você que o mundo tá cheio de gente preguiçosa. Você está ensinando essa garotada desde cedo que existem questionamentos inteligentes e questionamentos burros - os que dão preguiça no intelectual de alto gabarito".
Ele me olhou com aquela cara de "vou contar tudo pra diretora". Pensei "Me fodi". Mas já que tinha começado continuei:
"O questionamento da menina é pra começo de conversa suficientemente poético pra merecer a atenção até de um chimpanzé. Mas o que você não enxerga é que independentemente do conteúdo do questionamento, ele é importante por si só. A gente precisa incentivar a discussão, incentivar a dúvida. Por causa de uns tipinhos que nem você é que os jornais, a TV, os livros e as revistas estão cheias de gente dizendo "aaaaii meo deos, que preguiça dessa gente ignorante, infantil"
- porque não vêem importância nos questionamentos em si - só vêem importância nos questionamentos que passam pelo crivo de sua erudição. Tinham que ter aprendido a não ser preguiçosos desde o primário - ou ensino fundamental, como queira."
Meu colega de departamento estava gravando tudo, por isso que estou com o diálogo assim, debaixo dos dedos, palavra por palavra. Ele quer botar no YouTube, mas não vou deixar. Preguiça de ler os comentários depois.